Amizade é uma coisa legal mas nem sempre é possível ter amigos.
Desde criança, sempre tive poucas amizades e meus contatos se resumiam aos meus irmãos, primos e eventualmente algum vizinho. Quando adolescente, morando no interior do Rio, o aglomerado de casas e pessoas vivendo muito próximas, em tese favorecia a aproximação. Porém, mesmo nesse ambiente fértil eu não conseguia fazer parte de um grupo maior que duas ou três pessoas, sendo bem otimista. Minha interação com as pessoas sempre foram limitadas e circunstanciais.
O tempo passou e hoje vivo praticamente para o trabalho, minha pequena família, um cachorro, um gato, meus livros e a internet. No trabalho, tenho amizades que duram o tempo exato da carga horária. É um tipo de aliança e interesses mútuos dentro das paredes corporativas. Existe certo companheirismo, respeito, colaboração e até certa dose de humor, mas a pressa e o foco no trabalho não deixam espaço para uma conversa mais elaborada, reflexiva e tranquila sobre a vida. Tudo ocorre na velocidade dos ponteiros do relógio... Na vizinhança eu também não possuo amigos. Apenas compartilhamos a mesma rua e o ar que respiramos.
Não critico as alianças no trabalho pois são extremamente importantes. Ajudam, sustentam, protegem e possibilitam a sobrevivência. Acredito que na selva do mercado, uma boa aliança possui papel mais importante do que a "amizade tradicional". Durante a minha existência tive muitos conhecidos, poucos amigos e boas alianças.
Na juventude, eu gostava muito de sair de casa e ir às festas tradicionais da cidade. Essa era a diversão da época. Hoje esse divertimento deve ser considerado um programa de "Jeca" pelos jovens contemporâneos, mas na época, sem dinheiro e sem carro, era o possível para sair de casa para fazer algo diferente da rotina. Lembro que naquele tempo eu possuía apenas dois colegas na mesma situação e saíamos juntos para conhecer meninas... franguinhos de granja estreando e treinando na arte da paquera, com muita vergonha, pouco dinheiro e muitos hormônios.
Com o passar do tempo, fui me tornando bem independente. Os amigos se foram e aprendi a gostar de ir sozinho aos lugares. Escolher o próprio caminho não tem preço e esta é a sina dos espíritos livres. Em minha cidade natal, ainda tenho um amigo de longa data e costumo visitá-lo apenas uma vez por ano durante as férias, mas a distância geográfica não contribui para um contato mais frequente e a vida vai passando.
Conhecidos, tenho muitos...herdados do bairro, escola ou trabalho, mas são relações com encontros casuais e breves. No geral, a gente quase nada sabe sobre a vida do outro, no máximo o seu local de trabalho, o bairro onde mora ou o seu “time de futebol”. Resumindo, descubro apenas se estão vivos, doentes, velhos ou mortos.
E por falar em velhice, mudando um pouco de assunto...minha mente funciona assim e vou registrando conforme penso... Outro dia li umas coisas de um autor já falecido chamado Rubem Alves sobre o envelhecer. Ele contava que a famigerada frase “melhor idade” deve ter sido feita “por um demônio zombeteiro disfarçado de anjo que inventou que a velhice é a "melhor idade". Chamar velhice de "melhor idade" só pode ser gozação ou ironia”. Ele continua: O que é melhor? Ser respeitado ou ser desejado? Velhice é quando a gente começa a ser tratado como "objeto de respeito" e não como "objeto de desejo". Mas o que quero não é ser olhado com respeito, mas com desejo...
Voltando ao tema amizade, classifico-a em três tipos: a circunstancial, a interesseira ou aquela motivada pela admiração. O termo amizade está tão ultrapassado que parece que teremos que reinventar o significado literal mais adequado aos nossos dias. O maior exemplo da banalidade da amizade hoje é o Facebook.
Quando somos jovens, possuímos mais energia, vontade e necessidade de procurar um rebanho. Com o tempo, a maturidade, o desenvolvimento da independência, o cansaço pelo trabalho, o peso da idade e o interesses diferentes, inevitavelmente nos afastam das pessoas. Note como os velhos são solitários. Acho que o segredo para essa fase é o auto-conhecimento, desenvolvimento da auto-estima e aprender a gostar de sua própria companhia. Eu sei que falar disso hoje é muito fácil... terei certeza se o que penso hoje funcionará se eu alcançar a idade avançada, afinal, só se sabe o gosto da merda se você colocar na boca. Desculpe o termo, mas não existia outro exemplo neste momento para esse pensamento.
Na rede social, eu possuía muitos amigos até recentemente. Somavam mais de 300 pessoas em meu Facebook. Com o tempo fui percebendo uma certa indiferença e tomei a decisão de reduzir para aproximadamente 100 pessoas. Não digo que me tornei inimigo dessas 200 pessoas excluídas. Longe disso. Até arrependi de excluir algumas, mas desconfio que a reciprocidade não era a mesma... provavelmente nem notaram que não fazem parte da minha relação de "contatos". Algumas eu até me sentia incomodado por divergência de interesses... Tomei essa decisão porque acredito, posso até me enganar, não sou perfeito, que aquelas pessoas não me consideravam ou me ignoravam. Observei que haviam pessoas em minha lista que nem me cumprimentavam quando passavam por mim, mesmo eu tendo o hábito de olhar para a cara da pessoa, sempre! Se você está numa rede de interação, o mínimo que se espera, lógico, é a interação ou o compartilhamento de ideias. Agora, você fica compartilhando pensamentos, fotos e interpretações sobre o mundo e a pessoa apenas tomado conhecimento ou monitorando silenciosamente suas publicações, comportando-se como um cadáver ou um espião de sua vida... para mim não dá! Por um determinado tempo de ausência, até acho aceitável, mas por um longo período sem ao menos abanar o "rabo"...estou fora!
Hoje me sinto muito bem com poucos amigos. Gosto de minha vida (às vezes não), literatura, filosofia e isso me satisfaz. Aprendi também que pessoas solitárias compensam o deficit social ou afetivo através de atividades intelectuais e essa compensação pode ser tão prazerosa ou mais do que relações que sugam ou não acrescentam nada à nossa vida. De vez em quando me chamam para um churrasco de confraternização da empresa e dependendo do meu estado de espírito, às vezes compareço e até gosto. Quem me conhece apenas por essas palavras que escrevo no Blog, pode até concluir equivocadamente que sou uma pessoa hermética e que evita a todo custo qualquer contato com os humanos... na realidade não é isso o que ocorre. Em determinadas circunstâncias sou bem relacionado, receptivo e portanto não tenho esse problema.
Encontrei nos livros a companhia de gente que conversa comigo, ensina e me faz pensar. No mundo virtual também existem alguns grupos de discussão com pessoas espalhadas pelo Brasil, que embora não exista o contato físico, compensam uma boa troca intelectual. São grupos que nutrem o mesmo interesse pelas coisas da vida e isso é bom.
Hoje me conheço melhor e me suporto, sem interesse em forçar amizade em troca de likes ou atenção. Com o auto-conhecimento, amadureci e me acho uma boa companhia. Descobri que o bom relacionamento é pautado pela compatibilidade de gostos e o seu prazo de validade depende da afinidade, circunstâncias afins ou interesses envolvidos.
Existem pessoas cujo contato não consigo estabelecer uma conversa interessante. E nem sempre é por falta de repertório de minha parte. Modéstia parte, leio muito e consigo conversar sobre vários assuntos.
Moro no interior de São Paulo há oito anos e constatei, de modo geral, que as pessoas daqui não gostam de conversar. Quando vou à cantina do meu trabalho tomar um café ou iogurte, sempre puxo assunto, porque é muito desagradável ficar em silêncio num ambiente pequeno. Normalmente, com gratas exceções, a pessoa responde de forma lacônica ou sai rapidamente como aquele famoso coelho branco de Alice no país das maravilhas, que corria o tempo todo e dizia "É tarde! É tarde! É tarde até que arde! Ai, ai, meu Deus! Alô Deus! É tarde, é tarde, é tarde!". Conheço uns quatro ou cinco amigos no meu trabalho que sabem e gostam de conversar algo interessante, nos breves intervalos, mas o relógio, aquele carrasco do tempo não deixa... a maioria é daquele tipo que fica olhando para o chão, com cara de interrogação ou de poucos amigos.
Gosto de conversar sobre a vida e temas que continuam na cabeça mesmo depois da pessoa ter afastado. Isso é sinal de que a conversa valeu a pena. Agora se a pessoa que fala com você, além de não ter deixado ou levado algo interessante, ainda te deixa pior do que antes... melhor nem ter encontrado. Relação boa deve ser saudável e satisfatória para a vida. Penso assim.
Ufa! Sem querer, virou textão! Essas eram as banalidades que estavam em minha mente quando sentei de frente de meu notebook. Esse assunto pode ser continuado em outra ocasião porque tenho mais considerações sobre esse tema demasiadamente humano, porém, fica para uma outra oportunidade. Raríssimas pessoas conseguem ler um texto deste tamanho e como não sei fazer charge ou aforismos...
Até a próxima!