17/06/2016

Aposentadoria Vanderlei Lacerda




Hoje foi a despedida de um antigo colega de trabalho. Apesar de tímido, senti que deveria falar alguma coisa para ele durante a sua homenagem no auditório da fábrica onde trabalhamos. Tive que vencer essa minha limitação e me expor em público! Para registro desse momento, rascunhei as palavras abaixo e o dediquei em seu último dia de trabalho mais ou menos assim:

Por obra do acaso, percorremos o mesmo caminho há muito tempo. 
Nascemos em Barra Mansa. 
Vanderlei é filho de um leiteiro e eu de uma viúva. 
Conheci o Vanderlei quando estudávamos no SENAI. 
Éramos garotos e tínhamos 16 anos. 
O Vanderlei era magro, seus cabelos eram pretos, mas com esses mesmos olhos arregalados que vocês conhecem! 
Ele estudava Tornearia Mecânica e eu o curso de Fresador Industrial. 
Terminamos o SENAI e quando e cada um seguiu seu caminho. Só que não! Para usar uma frase dos jovens. 
Assim que saí do SENAI, resolvi trabalhar numa oficina de usinagem chamada ESFIL, uma oficina que ficava em meu bairro sem muita estrutura. Uma oficina sem banheiro, sem refeitório, sem café, sem sabão para lavar as mãos, sem EPI e principalmente, SEM FUTURO. 
E lá encontrei o Vanderlei mais uma vez! Ele trabalhava num torno mecânico antigo e eu numa velha fresa. Aquilo não era vida, mas era o melhor que tínhamos. Foi ali que tivemos a primeira oportunidade e sou grato até hoje por ter iniciado naquelas condições. Com a dificuldade aprendemos a dar mais valor na vida. 
Paralelo ao trabalho na oficina resolvi fazer o curso de desenho técnico no colégio Verbo Divino, um dos melhores cursos da região da época... lembro até hoje do professor Koiti Teresaki. E, para minha surpresa lá estava o Vanderlei novamente também fazendo o mesmo curso. 
Formamos em anos diferentes, mas sempre seguindo a mesma estrada. 
Até que em 1985 entrei na Nestlé de Barra Mansa como desenhista com 19 anos. Passaram dois anos e em 1987 lá estava o Vanderlei com seu olho arregalado! 
O Vanderlei foi para a oficina mecânica, sua paixão e eu fui para o Escritório Técnico. 
A fábrica de Barra Mansa funcionava como uma família. Só quem trabalhou lá sabe do que eu estou falando. O Tairo é testemunha disso porque trabalhou e sofreu com a gente lá. Nossa fábrica quase não tinha investimento, mas possuía uma outra riqueza que o dinheiro não compra: a amizade, o companheirismo e o trabalho em equipe. 
Existia uma competição muito grande com a fábrica de Araras. Araras sempre foi uma sombra para a nossa fábrica, mas isso foi legal porque havia uma competição saudável para conseguirmos números iguais ou melhores que Araras. 
Era uma competição saudável semelhante àquela existente entre irmãos querendo superar ao outro. 
Bem o tempo passou e a história de Barra Mansa não teve um final feliz e em 2007 recebemos a pior notícia de nossa vida profissional. 
Vivemos o momento mais dramático de nossa carreira que deixariam marcas para sempre. 
Lugar nenhum se aprende, estuda ou se prepara para fechar uma fábrica. 
Somos treinados para ampliar, construir, inaugurar e comemorar uma linha nova, uma fábrica nova e perseguir os objetivos. 
A fábrica de Barra Mansa seria fechada e suas instalações deveriam totalmente transferidas para Araras. 
E lá estávamos nós juntos para a missão mais dramática de nossas vidas! 
Eu fui o designado para ficar até apagar as luzes! Não foi fácil! Muitas noites sem dormir. 
Eu andava pela fábrica e escutava os ecos da fábrica em funcionamento. 
A sala vazia, a caldeira desligada...parecia uma fábrica fantasma. 
Naquele ano não estávamos transferindo apenas envasadeiras, tanques e bombas... 
Era uma parte importante de nossa vida que estava sendo modificada para sempre 
Aquela decisão representava a ruptura de uma era, da convivência diária e de nossos sonhos compartilhados. 
Sofremos muito despedindo de cada amigo. 
E as despedidas foram acontecendo de forma gradativa! 
E a cada despedida um abraço e muito choro. 
Choramos por diversas vezes. 
Pelas pessoas, pela fábrica, pelas histórias, pelos amigos. 
A dor era psicológica. Enquanto Araras comemorava a ampliação da fábrica, a gente sofria. 
Mas o tempo passou e as lágrimas secaram. 
Fomos convidados para trabalhar aqui nessa fábrica. 
Queríamos continuar a história Nestlé e a empresa nos possibilitou esse desejo. 
A fábrica nos recebeu muito bem e isso foi fundamental para suportarmos a distância de nossas raízes e continuarmos a nossa jornada, crescendo com a empresa e cuidando de nossa família. 
Hoje, passados 9 anos, podemos dizer que foi acertada a decisão de chegar até aqui. 
Tivemos obstáculos nessa caminhada e conseguimos enfrentá-los com honestidade, caráter, com o apoio da família e muita força de vontade. Não foi fácil chegar até aqui Vanderlei, mas conseguimos. 
De vez em quando bate uma saudade das pessoas, mas a vida continua e ficar preso ao passado é perda de tempo. 
Como vocês puderam reparar, tivemos muitas dificuldades para conseguir fotos com o Vanderlei, porque ele sempre estava debaixo de alguma máquina. 
Para finalizar Vanderlei, você foi um profissional exemplar com sua dedicação, disponibilidade e força de vontade. Um homem do campo que ama a mecânica e que não queria ser “chefe”, para usar um termo ultrapassado! 
Lá na minha casa, eu tenho um filho de 19 anos e eu sempre uso você como exemplo de superação e força de vontade, porque você veio para Araras com esposa e mais de 40 anos e conseguiu além de trabalhar todos os dias e inclusive finais de semana e ainda assim conseguiu, paralelo a isso, fazer uma faculdade de engenharia à noite, na UNIP, deixando sua mulher sozinha em casa e longe de todos os parentes e amigos e conseguiu formar a duras penas em 5 anos viajando essa Anhanguera, depois do árduo trabalho aqui dentro. 
Você é um exemplo. Te admiramos e que você consiga ter a mesma qualidade na sua vida que sempre buscamos para os nossos produtos desde que pisamos nessa estimada empresa. 


Obrigado mesmo pela companhia desses 29 anos! 




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