29/08/2014

Sobre abutres






Quando o sol aparece e os seus raios aquecem o ambiente, os abutres abandonam seus ninhos e rumam à porta dos enfermos em busca de alimentos. Eu disse porta dos enfermos? É isso mesmo Alex?

Não seria "porta do inferno" em menção àquela famosa escultura de Auguste Rodin, que consumiu 37 anos para ficar pronta? Nada disso, essa é mais uma metáfora insana que você só encontra no blog banal.

É porta dos enfermos mesmo a que me refiro!

O saguão do hospital encontrava-se lotado e o relógio marcava quatorze horas.


Na parede do fundo, um quadro com a foto de uma enfermeira tocava os lábios e pedia silêncio.

O ambiente estava tão cheio que quase ninguém se movimentava. Adultos, crianças, jovens e abutres aglomeravam-se na entrada principal esperando a sua vez de entrar.




E este banal que ainda escreve um pouquinho do que pensa, estava na fila aguardando a vez de entrar e enquanto isso, lendo o extraordinário livro "A dança do Universo" de Marcelo Gleiser.

Esse é o meu livro real

Enquanto isso, observava um grupo de homens trajando camisas brancas de botão, gravata, calça social, crachá e um livro, adentrando pela porta principal sem enfrentar a fila destinada às pessoas comuns.

Aquela prioridade me chamava atenção, mas fingi não me importar.

Pode ser algum trabalho voluntário de apoio aos doentes. Legal isso, penso assim para me sentir melhor.

Tenho certeza de que existem pessoas bem intencionadas e que fazem esse importante trabalho nos hospitais e asilos. Palavras de conforto ajuda a diminuir o sofrimento. Só quem vive na solidão sabe o valor de uma atenção. 

Porém, o mundo não é perfeito e sabemos que existem muitos oportunistas dispostos a capturar presas frágeis e indefesas para praticar o proselitismo.

E é nesse ponto que eu quero chegar. Por favor, não se sinta ofendido (a) se você realiza essa bonita atitude de visitar desinteressadamente aos doentes. Notou a palavra em negrito e sublinhada? 
Parabéns, se você faz parte do grupo de pessoas que dedicam seu tempo sem esperar nada em troca. Você possui o meu respeito! Temos o dever de apoiar aos que necessitam.

A minha implicância é direcionada àqueles que aproveitam o momento de fragilidade da pessoa para tentar convencê-las às suas ideias. Isso é muito feio!

Para quem não conhece a palavra "Proselitismo", bem resumidamente, trata-se de uma atitude ou "trabalho" que visa o convencimento de alguém a se converter a uma determinada causa, ideia ou religião.

Estou escrevendo isso porque me lembrei de uma visita que fiz à minha querida avó num num hospital de Barra Mansa, na véspera de sua cirurgia...

Eu estava ao lado de seu leito quando surgiu um desses bem “intencionados” oferecendo apoio psicológico em troca de adesão à sua causa. 

Exercício de amor próprio disfarçado de altruísmo.

E ai daqueles que não aceitam o “presente”... A verdade única... O único caminho...

Enquanto as aves se alimentam de restos de animais esses abutres se alimentam de desgraças e fraquezas...

Cheiram oportunidades à distância...

As pessoas são livres para escolherem o seu caminho ou nenhum caminho. Porque não!

Se alguém recusar a sua "verdade" recebe ameaças de punição eterna...

A isca sempre é lançada. Quem morderá? Alguma tragédia, miséria, saúde comprometida, crise emocional, desemprego... 

Conheço o processo.

Primeiro o apoio psicológico desinteressado... Até a próxima dose.

Com o tempo você vira refém...

Apostam tudo depois da morte e desprezam a vida... odeiam a dúvida e a sabedoria!

Deturpam a realidade...

Com o tempo, qualquer decisão banal deve ser consultada à liderança...se você já era um fraco, com o tempo se transforma num sujeito incapaz de tomar qualquer atitude. Vira escravo e quer obrigar todo o mundo a pensar igual ao seu grupo.

Pausa...

Minha querida vovó Hildi
Eu permanecia ao lado do leito de minha avó e beijava-lhe o seu rosto... Segurava suas mãos delicadas que tanto seguraram as minhas desde pequeno...Seus olhos meio azulados ainda brilhavam. Seu corpo cansado contrastava com a mente. Como ela era falante... Gosto dessa lembrança...

Nisso, um daqueles de camisa branca e crachá se aproximou, quebrou a nossa harmonia e pediu para orar. 

Sem problemas. Respeito.

Ele termina a oração e fala com autoridade para a minha avó: 

- Levante desta cama! Você está curada! É só ter fé! - disse o abutre como se fosse um médico.

Ela não pode. Está com o osso da perna quebrado. - digo-lhe com firmeza.

- Levante! A senhora está curada! - insiste o abutre.

Aí já é demais!

Meu sangue ferve, olho para o abutre e pergunto.

- O senhor é médico para ordená-la a levantar?

 - Não, não sou. Mas ela está curada.

- Você tem fé? - disse-me desafiando.

Não lhe respondo e o pergunto:

 - Posso então chamar o médico e comunicar que ela está curada e de alta?

 - Posso pedir ao médico para cancelarem a cirurgia programada? - emendei

- Ele agora fica em silêncio.

 Peço para ele se retirar.

Ele segura novamente a mão de minha vó e insiste:

 - Levante, a senhora está curada!

Mas que sujeito petulante! - pensei.

Meu sangue ferve e falo firme para o abutre:

 - Saia daqui agora antes que eu o retire...

O abutre levanta voo e parte para outra enfermaria em busca de outra presa...

Mas antes de desaparecer da porta, ele se vira e me olha com grande ternura e amor e dispara:

- Prepare-se, o fim está próximo!

Nesse momento a única coisa que me lembrei foi de agradecê-lo carinhosamente:

- Imbecil! 

Devolvo a gentileza e nos despedirmos!


 Elaborado pelo implicante, banal e pouco polido Alex Gil Rodrigues em 29/08/2014.

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